"Paisagem conhecida, a que vou observando, mas apezar d'isso interessante, porque o acidentado do terreno, interrompendo a cada passo o scenario, é como uma fita cinematografica desenrolando-se em plena luz. Muitos pinheiros nas encostas, placas de milho nos vales, arvores de fructo por toda a parte, e as cegonhas molhando o bico em fontes toscas, ou pegos minusculos que forma o rio, para fornecerem agua de rega. Recorta-se no horisonte, á esquerda, o Caramulo, de pincaros atrevidos, e vê-se á direita o macisso da Serra da Estrela, em que o Jorge Nunes, afincando a vista, quer por força vêr neve. Na maior parte das estações o movimento é zero, não entram nem saem passageiros, não se carregam nem se descarregam mercadorias, e não me lembro de ter visto nas estradas poeirentas, em muito bom estado de conservação, rodarem carros ou automoveis.
Lentamente se arrasta o comboio, mas como se vai arrastando sempre, acabará por chegar ao destino.
E assim foi que tendo deixado Lisboa pela manhã, ás quatro horas da tarde chegamos a Vizeu, com um calor de rachar."
in Brito Camacho (1862-1934), Jornadas (1927).
Encontrado em "Rua Onze"
Manuel de Brito Camacho (Aljustrel, 12 de Fevereiro de 1862 - Lisboa, 19 de Setembro de 1934), médico militar foi destacado em 1884 para a 2.ª Divisão Militar em Viseu, como castigo por ser activista republicano. Enquanto esteve na nossa cidade fundou e dirigiu o jornal - "O Intransigente". Viria a ser deputado, figura importante no derrube da Monarquia, tendo ocupado o lugar de Ministro do Fomento (1910-1911). Biografia
Ilustração:
Bilhete Postal Ilustrado, "VIZEU (da Via-Sacra)", Edição da Casa de Modas, Delfim Corrêa, Vizeu (Fotógrafo desconhecido, Não circulado, Datável dos primeiros anos do séc. XX (anterior a 1910)