EDITORIAL


Quando eu me poupe a falar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar!
José Régio


Aqui o "Acordo Ortográfico" vale ZERO!
Reparos ou sugestões são bem aceites mas devem ser apresentadas pessoalmente ao autor.

20160413

Os "Mártires da Liberdade"




“Terminada a campanha contra os franceses em 1814, seguiram-se as guerras civis que ensanguentaram Portugal, este districto e a própria cidade de Viseu, pois em Lamego teve o sr. D. Miguel um deposito de 400 a 500 presos politicos, que soffreram as maiores torturas, comprehendendo pessoas de todas as cathegorias e até alguns lentes da Universidade, - e em Viseu teve uma comissão mixta, de magistrados civis e militares, que foi o terror da Beira e mandou fuzilar 25 pessoas. Foram as seguintes:

Primeira sentença
23 de Agosto de 1832

- Padre Laureano Pinto de Noronha, natural da quinta da Aveleda, freguesia de S. Chrystovam de Nogueira, concelho de Sinfães
- Padre Caetano José Pinheiro, natural da povoação de Villa Chã, freguesia de Nespereira, no mesmo concelho de Sinfães, e
- Padre Antonio Alberto Pereira Pinto Monte-Roio, natural da povoação de Casconha, freguesia de S. Thiago de Piães, no mesmo concelho.

Segunda sentença
17, ou 19 d´outubro de 1832

- Fr. Simão de Vasconcellos, monge de S. Bernardo, natural da quinta do Outeiro, freguesia de Cesár, então concelho da Villa da Feira e hoje de Oliveira d’Azemeis, ali rezidente por breve apostólico.
- Antonio Joaquim da cidade do Porto, forriel do batalhão de caçadores n.º 12.
- Joaquim Gonçalves, da freguesia de Casaes, então concelho de Penafiel e hoje de Lousada, soldado do mesmo batalhão.
- Francisco José Marques, da freguezia de Sanfins, concelho da Feira, soldado do batalhão da Serra, organizado no Porto.
- José d’Oliveira, do logar de S. Gião, freguesia do Souto, concelho da Feira, casado, lavrador e soldado do batalhão de Villa Nova, organisado no Porto.
- Joaquim José da Silva, natural do Porto, soldado de caçadores n.º 2.
- Luiz Ferreira da Costa Sant’Anna, da freguesia de Ranhados, junto de Viseu, mas residente no Porto, e ali hortelão dos padres loyos, de 65 annos de idade

Terceira sentença
24 de Outubro de 1832

- José Francisco, natural de S. Martinho d’Argoncilhe, concelho da Feira, casado, proprietário e soldado de caçadores n.º 5.

Quarta sentença
30 d’outubro de 1832

- D. Fernando Gutierres Galon, natural de Algeciras, na Andalusia.
- D. Paschoal Alpalhez, natural da villa de Sague, na Hespanha.
- D. Antonio Ximenes, da villa de Tarragona.
- D. Eusebio Paschoal, da villa de Navalcan.
- Manuel Sanches Garcia, natural de Saragoça, capital de Aragão.
- D. Benito José, natural da freguezia de Sonera, arcebispado de S. Thiago, na Galisa, soldado do batalhão da Serra, no Porto.

Quinta sentença
21 de Março de 1833

- Antonio Homem de Figueiredo e Sousa, natural da Cruz do Souto, freguezia de Farinha Podre, concelho de Penacova.
- Antonio Joaquim, natural da aldeia de Varzea da Candosa, freguesia de Candosa, concelho de Taboa.
- Padre Antonio da Maia, natural da Cruz do Souto, freguesia de Farinha Podre, parocho encommendado da freguesia de Covellos d’Azere, concelho de Taboa.
- Francisco Homem da Cunha, filho de Bernardo Homem e irmão de Guilherme Nunes, do logar e freguesia da Cortiça, hoje concelho de Arganil.
- Francisco de Sande Sarmento, solteiro, natural da povoação da Carvoeira, freguesia e concelho de Penacova.
- Felisberto de Sande, irmão do antecedente e natural da mesma povoação de Carvoeira.
- Guilherme Nunes da Silva, filho de Bernardo Homem e irmão de Francisco Homem da Cunha, mencionado supra.
- José Maria d’Oliveira, natural da Povoação da Cortiça, freguesia de Paradella concelho de Arganil.”

Aqui ficam as identidades dos 25 "Mártires da Liberdade" encontradas no “Portugal Antigo e Moderno Diccionario…” de Augusto Soares de Azevedo Barbosa de Pinho Leal, continuado por Pedro Augusto Ferreira. Lisboa, Livraria Editora de Tavares Cardoso & Irmão, 5 - Largo de Camões – 6, 1890.

Um monumental sarcófago foi erigido em 1836, no claustro da Sé de Viseu, para recolher as ossadas dos mártires cujos nomes foram gravados no granito mas o tempo "apagou". Na arca tumular Fernando Almeida Machado (1) apenas conseguiu leu o seguinte em latim e em vulgar:
“PELA ADESAÕ À LIBERDAD.E, CARTA E D. MARIA II POR INÍQUAS SENT. FORAM INOCENTEM.TE CONDENADOS E FUZILADOS EM 1832 E 1833.”

António Alves Martins (1808/1882)  que viria a ser bispo de Viseu só não consta nesta lista porque fugiu. O jovem padre franciscano tinha um passado muito ligado aos liberais, no entanto foi nomeado compulsivamente, no início de 1832, para  capelão da fragata "Pérola". Tendo recusado para não servir o miguelismo, foi detido e encerrado na cadeia de Coimbra. Julgado foi condenado como traidor e deveria ter sido fuzilado no dia 28 de Janeiro, em Viseu no terreiro de Santa Cristina (2). Salvou-se porque durante a viagem logrou fugir. numa rocambolesca fuga que deverá ter contado com a ajuda de alguém da escolta.

Infelizmente aqueles que deram a vida pela Liberdade foram esquecidos e os seus nomes já não podem ser lidos no frio granito. A Câmara Municipal de Viseu deveria criar condições para que os funcionários do cemitério tivessem um local próprio para arrumações e respeitassem o monumento que em meados do século XX, foi transferido do lanço oeste do Claustro Renascentista da Catedral de Santa Maria de Viseu, para lugar “discreto” no Cemitério Municipal (Pedras Alçadas) (3).

1 – “Alves Martins Percursos de Liberdade” de Fernando Augusto Machado in “Tempo, Escritos e Iconografia – Comemorações do Bicentenário do Nascimento de Alves Martins 1808-2008”. Editor Escola Secundária Alves Martins, Viseu 2009.
2 - "O bispo revolucionário" de Paulo Jorge Fernandes in "D. António Alves Martins - Bispo de Viseu e Defensor do Reino",  Edição AVIS, Viseu 2008.
3– “A Sé Catedral de Santa Maria de Viseu” de Alexandre Alves, Edição Câmara Municipal de Viseu e outros, Viseu 1995.